Álbum de fotografias, soltas à nostalgia característica; mas não me recordo de ser parte alguma desses olhos de quem sente. Não lhe chamemos memória escassa, escondida, esquecida…não me roga a consciência de ser boa, num distante prazo seria elefante ingénuo num país de fome. Não sou “eu”, sou antes “ele”. Que assim se entenda em boa verdade.
Nas primeiras, aquela cor, cheia de luz e ingenuidades fantásticas. Todo um mundo por descobrir, tantos véus de seda a lamber a ponta dos dedos curiosos. “Olha o passarinho!” e logo se solta uma gargalhada chilreada. Nunca cheguei a perceber, como que um “não sei, não quero saber e tenho raiva de quem saiba” fingido, de onde vem tanto que se perde nas outras? Hoje são artificiais, cheias de artifícios de alta definição, mas não igual, imitações industriais.
“Vó, passharinhos”, de indicador em riste, e logo corre para os fazer voar, essa praga que, hoje, apelido de “ratos-com-asas”. “Bhaaaa!” solta-se uma careta reguila para a “Minolta” da tia , e hoje procuram-se ângulos e pontos de luz perfeitos, aperfeiçoáveis preferencialmente. “Ena, vê-se tudo lá ao longe”, a espreitar pela câmara do primo, numa travessia pelo Tejo…
Ainda recordo a minha primeira máquina fotográfica, de cinzentos leves, azuis claros alguns amarelos, carregada com um filme de duas bobinas - “Vá, agora não gastes todas de uma vez, só para ocasiões especiais” . Não gosto de “gastar”. E como é que as fotografias se gastam? E o que são “ocasiões especiais” quando o mundo ainda é uma descoberta? Essa contenção que hoje se simplifica por centenas de oportunidades. E vou-me perdendo nessas ocasiões especiais. Cada imagem uma diferente emoção, sensação. Faz-se um misto de querer voltar e também de partir, criar outras memórias ou recordar.
Agora percebo porque nos ensinam a “sorrir para a fotografia”. É o que fica da família feliz, um momento didáctico de preservação lúdica; ensina-nos a camuflar as emoções, porque ferem nesta selva socializada, onde sociedade é, cada vez mais, um conceito “in door”, com horários restritos. Quando criança, a verdade é perdoada com ingenuidade, ou amordaçada de outras forças. Não sabemos ser a verdade que tomamos como nossa, nem ser as emoções que escondemos em máscaras de cera, nem ser a ingenuidade que perdemos para o mundo. Acredito que, no fim, já não nos sabemos ser. Nesse fim, resta-nos recordar…