
Some of my puzzle key
* Amante ou amador?
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Quem sou eu?
Eu assumo a minha ingenuidade. Como amante de quem escolhi, fui ingénuo. Na verdade, não fui eu que escolhi e também não fui escolhido. Aconteceu, como sempre acontece. Não se trata daquele dilema da virgindade roubada, outras pontes foram atravessadas e esperemos que mais encontre pelo caminho. Mas de todos os rios que atravessei, nenhum outro me mostrou tanta vida, tantos sentimentos, tantas emoções, tantos sonhos.
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Destino?

Não sei se existe. Aterroriza-me a ideia de uma força maior. A ideia de seguir um caminho trilhado após o primeiro momento de existência ou mesmo antes. Cada passo de incerteza manipulada. Um passo, um sorriso – outro, uma lágrima – mais um, o desejo – tropeço, na fantasia – caio, a dor que não é física – levanto-me, e sigo o meu caminho. Ardem as feridas deste corpo suspenso por linhas invisíveis. E a alma não é de ninguém.
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Gémeos e balança?
Duas faces, entre a Lua e o Mar. Oscila em pratos dourados, seguros pela cegueira. É desconcertante a mudança contínua de quem não sabe que as nuvens são feitas de açúcar e que a terra está coberta de espinhos. Ainda assim, as rosas brancas são mais belas quando manchadas de sangue. Quando um anjo cai no mundo dos vivos e tenta ser Homem, perde-se nas sombras e torna-se inconstante. Vive apenas nos sonhos que projecta à fantasia e à criatividade.
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Por que não esqueço?
As memórias seladas num olhar. Vejo todas as ruas pelas quais errei e aqueles com quem me cruzei. Os rostos e as expressões, as vozes que me invadem no silêncio. E sempre que me vejo é na 3ª pessoa e ela sorri para mim, ou chora comigo. Abraça o corpo despido sem qualquer pudor – conhecem-se bem. Depois consigo sentir na pele aquele toque marcante, nos lábios o gosto daquele primeiro beijo, a fraqueza e a ansiedade. Os batimentos cardíacos, a respiração, o calor.
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Entre a carne e a alma?

As correntes são de prata e ferem-me sempre que tento libertar-me. Olhas-me silencioso e sem expressão. Chego a gostar da dor que sinto quando me puxas contra ti e rendo-me quando as nossas línguas se tocam. Deve ser do teu veneno. E enquanto percorres o meu corpo, que conheces melhor que ninguém, sinto o trespassar da lâmina, das costas ao coração, vezes sem conta, sarando quando a arrancas para que a possas cravar sempre que quiseres. Sei que gostas de provar o sabor da minha dor enquanto me consomes.
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Quantas são as palavras?
Faço do meu sangue a tinta e de um punhal a pena com que rasgo as palavras na minha pele. Soltam-se os gritos oprimidos num casulo de medos. A criança que se contorce enquanto o corpo ganha forma e a alma se expande aos limites do próprio ser. É um problema de expressão. A língua humana é limitada e confusa. Tantos signos para a mesma existência, um turbilhão de distinções sociais e culturais que só empobrecem a verdadeira essência. E ainda assim, é nelas que me escondo, liberto e defendo.
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Por quem sou?
Aprender um olhar leva tempo até que possa haver nele cumplicidade. O que vês nos meus olhos? Podes ver todo o mundo que me ajudares a construir. Não me mostres um quadro dizendo que é um espelho. Com que tintas me pintas-te? Com que cores? Tudo pela verdade. A partilha de um sorriso ou de uma lágrima é como um botão de rosa sem espinhos, e ambos o seguram. Aceitas o que vez? Eu aceito o que vejo e dou-te a sinceridade.
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Gosto de…?

Sentir o vento nos cabelos, o sol a queimar-me a pele e a chuva a embeber o meu corpo, para depois cair de uma falésia e envolver-me no mar banhado pela lua. Aquele sono profundo que me entrega aos sonhos com que me construo. Quero o prazer da solidão e o ruído de uma praia deserta. A música alta, um cigarro aceso, um copo cheio e o prazer dos amigos. Cheirar os perfumes das flores do campo e lançar-me nas nuvens brancas num céu azul. O mundo como um eterno prazer de tequila com sal e limão.
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Qual a verdade?
Procuro-me todos os dias. O que há para além do tempo? Não existo e tudo o resto é uma ilusão; a carne é apenas uma ilusão; os sentidos, o que é sentir? A diferença é condenada. Desintegro-me em grãos de areia, num espectro de loucura com um olhar insano. E tudo para me encontrar. Ser mais que fragmentos de algo inacabado. Ser um todo num só gesto. Abraçar o corpo, abraçar a alma, abraçar-me sem recear o futuro. Contudo ainda me sinto distante dessa realidade. Nem eu sei quem sou.
E para trás, o que restou? Um pouco de tudo, um pouco de nada. A loucura oferece uma visão que tenta a levantar questões tão complexas quanto insanas. E quanto mais questionamos, mais loucos ficamos. É um ciclo vicioso. Cada um vê como quer, outros fingem que vêm e outros fingem não ver. Eu simplesmente vejo. Agora, o que vejo, nem eu sei…