sábado, fevereiro 27, 2010


Um Naufrago, talvez…

Sou mais que matéria orgânica
Essa fonte consumida pelo tempo
E o resto ferve inconsciente
Combustão de actos, ideologias, emoções
Onde a carne guarda o olhar

As minhas palavras nos teus gestos
Os teus gestos nas minhas palavras
Fermenta o veneno de outros dias
Perdendo-se o corpo nas tuas mãos

Esse fumo que se dissipa na neblina nocturna
Fúnebre olhar o nosso
Tão cerrado que não se vê
De mim – talvez nunca tenhas existido
Talvez se tenha perdido, talvez…

Não sou o corpo, não sou a terra
De que te valeram as conquistas,
Todo esse sangue perdido por capricho teu?
Ainda nos conseguiremos ouvir?

Foram palavras naufragadas
Um esgar de sorte
O respirar desse mar silencioso
De tão profundas distâncias
Talvez o infinito, se não se perderem.

terça-feira, fevereiro 16, 2010



Deixem-me dormir...


Procuro exorcizar as palavras e o silêncio das emoções, ser a liberdade dos outros. Mas tudo o que alcanço resume-se à vertigem no limiar da sua falsa concretização.

Saudade, essa expressão melancólica, esse tédio de respirar. Não me contenta a espera, a sensualidade subtil adormecida. Anseia o corpo a liberdade de ser o vento numa falésia azul, perder-se a noção de Newton e o veneno da sua maçã. Caí na tentação de a morder e apenas recordo o doce ardor a escorrer-me pelos lábios ainda quentes; tudo o resto dissipou-se sem a mais pequena justificação, porque essas coisas não se justificam, sentem-se apenas, fervem por dentro e da espuma surge a saudade.

Como posso ter saudade do que nunca tive? Será verdadeiramente saudade a noção de ausência concreta do que se idealiza e sonha intimamente, mesmo sem nunca ter provado o antídoto do nosso próprio veneno? Digo-o porque apenas brinquei de alquimista, de inventor do eterno capricho dos meus sonhos infantis.

E porquê sonhar quando o sonho não nos basta? Não me contenta ou satisfaz a réstia de luz de um profundo sono, mas ainda assim deixem-me dormir.