terça-feira, novembro 15, 2011



Álbum de fotografias, soltas à nostalgia característica; mas não me recordo de ser parte alguma desses olhos de quem sente. Não lhe chamemos memória escassa, escondida, esquecida…não me roga a consciência de ser boa, num distante prazo seria elefante ingénuo num país de fome. Não sou “eu”, sou antes “ele”. Que assim se entenda em boa verdade.
Nas primeiras, aquela cor, cheia de luz e ingenuidades fantásticas. Todo um mundo por descobrir, tantos véus de seda a lamber a ponta dos dedos curiosos. “Olha o passarinho!” e logo se solta uma gargalhada chilreada. Nunca cheguei a perceber, como que um “não sei, não quero saber e tenho raiva de quem saiba” fingido, de onde vem tanto que se perde nas outras? Hoje são artificiais, cheias de artifícios de alta definição, mas não igual, imitações industriais.
“Vó, passharinhos”, de indicador em riste, e logo corre para os fazer voar, essa praga que, hoje, apelido de “ratos-com-asas”. “Bhaaaa!” solta-se uma careta reguila para a “Minolta” da tia , e hoje procuram-se ângulos e pontos de luz perfeitos, aperfeiçoáveis preferencialmente. “Ena, vê-se tudo lá ao longe”, a espreitar pela câmara do primo, numa travessia pelo Tejo…
Ainda recordo a minha primeira máquina fotográfica, de cinzentos leves, azuis claros alguns amarelos, carregada com um filme de duas bobinas - “Vá, agora não gastes todas de uma vez, só para ocasiões especiais” . Não gosto de “gastar”. E como é que as fotografias se gastam? E o que são “ocasiões especiais” quando o mundo ainda é uma descoberta? Essa contenção que hoje se simplifica por centenas de oportunidades. E vou-me perdendo nessas ocasiões especiais. Cada imagem uma diferente emoção, sensação. Faz-se um misto de querer voltar e também de partir, criar outras memórias ou recordar.
Agora percebo porque nos ensinam a “sorrir para a fotografia”. É o que fica da família feliz, um momento didáctico de preservação lúdica; ensina-nos a camuflar as emoções, porque ferem nesta selva socializada, onde sociedade é, cada vez mais, um conceito “in door”, com horários restritos. Quando criança, a verdade é perdoada com ingenuidade, ou amordaçada de outras forças. Não sabemos ser a verdade que tomamos como nossa, nem ser as emoções que escondemos em máscaras de cera, nem ser a ingenuidade que perdemos para o mundo. Acredito que, no fim, já não nos sabemos ser. Nesse fim, resta-nos recordar…

segunda-feira, agosto 01, 2011



Esqueço (por vezes?) o silêncio
Assim como das palavras que não digo
Porque a liberdade se for ferida
É consciência consentida
E não mais que certa razão
De não esquecer ser humano.

Perguntei-me,
Pelas palavras nunca ouvidas
Ou mesmo escritas.

Ousara o vento nas folhas secas
Do sol, de um dia, de uma vida
Desenhar dourados versos
Pelos quais me perguntei.

Perguntei-me,
Pelos gestos nunca feitos
Ou mesmo ditos.

Rebentava a espumar-se na rocha árida
Toda feita de ironia
Disfarçada melancolia
Pela qual me perguntei.

Perguntei-me sem me perguntar;
Por tanto que esqueci
O silêncio de mim.

(Num momento)
Era a liberdade de respirar como sopra o vento
Dançar como as folhas douradas
Ser das vagas o eterno regresso!

E no fim não restavam perguntas
Ou mesmo fáceis respostas
Sobrei-me sóbrio de simplicidade
Embriagado de sonhos e vontades;
Dentro de mim, respondi-me,
Sem me chegar a perguntar…

terça-feira, abril 19, 2011



…Só porque sim !

Faço-te de conta
Num oportuno instante
E tu, que me fazes de outras contas,
Quantas fingidas?

Sorri, porque não quer mais do que quer:
A subtracção enfadada de cuecas ao mundo.

É vergonha disfarçada,
Hipocrisias bonitas, coisas feias!
Não te gosto, não me gostas,
Faz de conta que sim…

domingo, abril 10, 2011


Saberia esconder-me no sussurrar do vento, na dança que provoca no verde das árvores que enchem os olhos de quem nada tem se não ás palavras que lhe oferecem, mendigas.
Sentei-me de costas para o mundo, só pelo prazer de me surpreender à sua mudança no momento em que decidisse partir. Entretanto, satisfaço-me com as vozes que se diluem entre si, nas suas vidas distantes, tão indiferentes como eu o sou.

Minto quando as tomo como indiferentes. Procuro nelas a familiaridade de fazerem parte de mim. A cada instante sou a fantasia de me aproximar delas e tocar-lhe como me tocam. No Horizonte procuro a semelhança de outros dias, dos quais faço hoje o luto do meu silêncio, na esperança de que, quando me voltar, já o mundo de ontem tenha sucumbido.

A metamorfose vem de dentro, com o desejo de rasgar o túmulo em que se encarcera o desejo da mudança. Não o fazer é sufocar lentamente, até morrer…

terça-feira, abril 05, 2011

O Prazer de não saber

Não sei onde te perdi,
Como me achei, mergulhado
Nessa tua sede sem vontade.

Nos vidros lambidos
De uma janela, desenham-se
Sombras sem gente
Iguais ao medo que se sente
Quando se desconhece.

Erro a memória, incógnito
E tudo o que oiço são gritos
Silenciados pelo pudor,
E tudo o que vejo são portas
Trancadas pela ignorância,
E tudo o que sinto é o ardor
De fracos desejos e horas mortas;

Não é ódio ou rancor
A roer-me a consciência, é outra dor,
Não a tua sede, não a minha fome
É qualquer jeito semelhante
Das coisas que finjo ser.

Céus sem cor flúem-me
Outros véus de efémera elegância
A morrer na minha história:

O prazer de não me ser…

quinta-feira, fevereiro 17, 2011


...
Procuro na noite silenciosa
Palavras de um mundo sem rosto,
Um instinto vencido,
Despido na sombra de uma velha árvore,
Para que me seque o desejo
E nunca mais te veja morrer
Numa qualquer guerra sem nome…

sexta-feira, fevereiro 04, 2011



Opiniões e ideias, todos as sabemos ter. Talvez umas melhores que outras, talvez umas mais válidas que outras, contudo, o seu valor de verdade e sentido assume-se pela vontade de cada um.
Disse-me não acreditar em bondade ou maldade humana, mas sim na complexidade individual. Contudo, preferia idealizar-me desequilibrado, num acto de benevolência de “Joane, o parvo”, ao invés de um “Judas“, sacana, pela salvação da alma corrompida.
Ser humano é jogar pelos interesses e cobrar, de boa vontade, favores e recompensas, com mais ou menos postura e decência. O resto são interpretações pessoais. É opinião endereçada a quem a souber verdadeiramente ler.

terça-feira, fevereiro 01, 2011


Actos espontâneos, apetece ao entardecer, na ânsia de uma página por agendar.

O passo sempre apressado guiou-o àquele bar que outras memórias tinha, mas para se ver sentado, cheio de orgulho, numa mesa vazia. Com a primeira imperial vieram os projectos delineados numa folha de jornal, com música e outras vidas que julgava desconhecer. Deixou-se ficar para mais uma, enrolando os bigodes lúcidos, observava nos outros um pouco de gente, de si e das suas vontades.
O que alguns chamavam de lavar roupa velha, ele via como um acto de reciclagem de emoções. Rejeitar outro pela indisponibilidade emocional não obriga à fuga de tantas outras que o caracterizam. Alguns procurou, outros acenaram com um sorriso, e no final do dia tinha tudo, menos a rotina solitária do seu telhado.
Provou gelado com sabor a nata e morango e riu-se desse acto inocente, sentindo-se. Depois lembrou-se que não provava, era antes o degustar de um momento, tantas vezes encontrado nas próprias raízes; essas que tocam outras, que crescem numa tentativa de alcançar o mundo!
Confiou-me, nessa mesma noite, ser o felino mais feliz dos telhados de Lisboa, quase ronronando olhos cheios de lua. Na consciência da efemeridade desses actos quase instantâneos, fez-se prometer que, com empenho, alguma vontade e um pouco de sorte, faria dos sonhos de ontem os projectos de amanhã.

Talvez viesse a ter um nome, um nome só dele. Mas isso já é outra história.

quinta-feira, janeiro 27, 2011


Dust, shadows and change

Erguer um castelo, onde cada pedra é feita de sonhos infindáveis, ingenuamente tomados como imortais e eternos, pode custar o suor da alma. Para o destruir, não são necessários séculos de abandono ou desleixo, basta o poder do gesto humano, como ordinária pólvora.
Como um príncipe mimado pela ânsia de alcançar o todo, perdeu-se em palavras desonradas. E sem título de nobreza, vagueia nas ruas solitárias de uma cidade tão cheia de tudo, com tão pouco para oferecer aos seus olhos cansados. Restar-lhe-ia a fé nos Homens, não fossem vagas orações a um deus convenientemente míope.
Das ruínas, mais que história, faz-se memória. Da memória, mais que sabedoria, faz-se uma vida. E da vida, mais do que um sonho, faz-se o que se quer , tanto de nós como dos outros, numa balança deficientemente calibrada.
Não é a mudança que cria o medo, porque três vezes terei a ousadia de dizer quem sou. Não são as âncoras que me prendem, nem as velas que se rasgam. É a prematura criatura insegura que faz nojo à simplicidade da descoberta de um novo mundo.

terça-feira, janeiro 18, 2011


A poison aPPle !

Hoje sinto-me tentado a representar cada palavra, antes de fazer dela verbo. A ingénua liberdade tem um preço que nem sempre estamos dispostos a pagar. Talvez fosse uma metamorfose de géneros, tão próximos do corpo, desonrados signos, uma crónica amnésia tendenciosa aos velhos costumes do século; ou talvez fosse o mesmo.
Terei jeito ou engenho? As más línguas dizem coisas, coisas de seu interesse, de seu (des)gosto, e eu digo outras, e os outros dizem outras coisas. Todos temos algo a dizer, seja curto ou grosso (há quem prefira a versão curto-e-grosso).

Por algum motivo, a palavra referendo não me sai da cabeça…

segunda-feira, janeiro 17, 2011



AGE/PLANS ?

Senti-me envelhecer ao planear o futuro. Grande erro, tentar prever o desenvolvimento financeiro em 10 anos e projectar tópicos por etapa. Não foi o sonho, aliado à sóbria atitude, que me fez envelhecer, mas ousar pensar em voz alta.
Planeamos os estudos, a carreira profissional, a construção de um lar e o seu recheio, entre mobílias, objectos e o amor, essa palavrinha indiscreta, que adivinha uma provável família. No final das contas, tinha 35 anos, e a perspectiva de um romance por escrever.
Será isso viver? A constante pergunta de “o que queres ser quando fores grande”? E o que é ser grande? Segundo Florbela Espanca, seria ser poeta e maior do que os homens.
Não o ser faria de mim um vagabundo numa cidade de fantasmas, e mais não teria que um corpo.

domingo, janeiro 16, 2011



?
Não ousas ser mais que mortal?
Fechar os olhos e voar sobre um oceano azul,
Respirar…
Não ousas sonhar?
Fazer desse a tua vida…
Não é fazer de ti um deus,
É fazer de ti um ser tão vivo como a grandeza do mundo.

De casaco e vício nos lábios, lembrei-me de pisar a calçada apressada; talvez pelo ar frio e ideias quentes.
Entrei numa cyber loja de conveniência. Depois das lojas chinesas, tornaram-se “moda” a crescer como humidade nas velhas ruas de Lisboa. Não me choca, ainda que já tenha contado, num perímetro de 300 metros da minha residência, quatro desses convenientes postos de venda, abertos horas incontáveis. Não me choca serem exploradas por uma outra nacionalidade, onde chegamos a ver esposas fieis ao lenço ou à burca. Chocou-me, entrar, e ver duas fileiras de pc’s, em caixas individuais, semelhantes àquelas em que exercemos o dever de voto, cada uma ocupada por um cidadão, cada cidadão mais diferente, ou semelhante a si mesmo, que o anterior. Desde o teenager com tendências góticas, ao padrão da senhora de meia idade embrulhada no seu roupão, todos dobrados sobre os seus corpos adormecidos.
Paguei e saí Quando julguei não ser pior, um bar “aneonizado”, a meia luz e som, que deixava espreitar um corrido balcão adornado de monitores, ratos e teclados, com um certo "cyber glamour".
Será o que dizíamos futuro, ontem? Ainda que adepto de comunidades virtuais, sóbrio, será uma espécie de tentativa de pegar nessas tendências e exteriorizá-las? Se o progresso é “virtualizar” o sonho, porque não torná-lo real?
Regressei, ofegante, e alimentei-me do meu orgulho.

quarta-feira, janeiro 12, 2011


Nostálgico, ansioso e de pouca vontade em içar âncoras. Era o orgulho, um bicho selvagem e ferido, cheio de verdades que não consentia dizer, murmurava-as apenas, com a satisfação do ruído da cidade.
Foi assim que te reencontrei, vazio de ti e dos outros, a sorrir à luz destes dias de Inverno. Não sobravam palavras, contadas nas bocas de um mundo cheio de artistas pouco aptos ao seu manuseamento; mas os teus olhos chegavam para me perder no Mundo que o Homem esqueceu.
Demo-nos, porque ambos sabíamos que a existência de ambos não era mais que mera coincidência, e o tempo tem o valor que se lhe quiser dar, nenhum. E se nos voltarmos a perder, saberemos certamente quais as ruas que trilhámos, com incerta consciência do que nelas julgámos ver.