segunda-feira, abril 05, 2010



Saber saber

Saber encontrar-se num pormenor
Essa insensatez mesquinha
Sorria para as tempestades urbanas
Sem o pudor dos mendigos;

Saber ser – exige-se orgulho!
Esse complexo de pequena vontade
Fazia de ti barqueiro no mar azul
Que lentamente te abraçava.

Saber sentir-se na liberdade do vento
Esse tempo que escasseia nas palavras
Erguidas como velas sobre os astros
De um mundo inteiramente seu;

Saber ver – o olhar de um anjo!
Essa perversidade ingénua
Em que se desconhece mais que do mundo
O sonho de uma criança…

Restos de fogo, o fumo de ontem;
No corpo a guerra, na alma a guerra!
Resta saber o que sabem os Homens
De Si, dos Outros e do Mundo?

domingo, abril 04, 2010



Lembrar hoje, construir amanhã…?

O império é na sua mente um comum abrigo inflacionado, tudo o resto são pequenos blocos coloridos pela criatividade de cada um. Não vive de sonhos porque sempre que os abraça são de areia a esvair-se nas suas mãos vazias. Disse-mo enquanto murmurava as gordas de um jornal datado, sem nunca me olhar nos olhos. Ambos sabíamos que era melhor assim, apenas palavras soltas para não nos embrenharmos na melancolia das nossas leituras incompletas.

Lembras-te de quando éramos pequenos? Tu construías os mundos que eu desvendava numa caixa de cartão. Mais tarde cantavas numa folha de papel as palavras que embebia em tinta-da-china. Lembras-te?

Agora procuramo-nos na janela embaciada da madrugada e nunca sabemos se nos veremos nela, ou se apenas o toque húmido e frio da sóbria existência. Já não se sonha ingenuamente. Amanhã dormiremos de janela aberta para deixar entrar um pouco de lua…

sábado, abril 03, 2010



Analgésicos

Ontem acordei na paisagem dos teus olhos
Essa fantasia anestesiante.

Dá-me morfina!
Rouba-me as palavras para que não lamente
A expressão ausente;
Corta-me a língua para que não prove o sal
Desses mares em que navegas.

Dá-me morfina!
Deixa-me adormecer no fogo da pólvora
Ensurdecedora tempestade;
Queima-me a pele
Não quero sentir a posse do corpo…

Desejam-se insensatas virtudes
A definição de uma perpétua nudez marmórea…