sábado, abril 12, 2008


O Dragão e a Lebre

III

Os raios de Sol começaram a surgir por entre as nuvens que se iam extinguindo pouco a pouco, aquecendo e iluminando a terra molhada. O Dragão levantou as suas asas para que a lebre sentisse a mudança do tempo. E, pela primeira vez, esta pôde vê-lo à luz do dia, iluminado pelo Sol. As grossas escamas que o preenchiam, desde o crânio até ao fim da cauda, ainda molhadas, misturavam todas as cores de um arco-íris, dançando entre si. Já o ventre, despido e vulnerável, apresentava uma cor suave como pérola, assim como as suas grandes asas de morcego. O pequeno coração da Lebre palpitava velozmente ao admirar a beleza do imenso Dragão e, se a sua pele não estivesse coberta pelo suave pelo, branco como a neve, tê-la-íamos visto corar. Os seus olhos cinza cruzaram-se com os azuis do Dragão e, atrapalhada, desviou o olhar. Gerou-se um breve silêncio que os comprometia. Também o Dragão a olhava enternecido.
- Que fazias por aqui? – questionou a Lebre para aliviar a estranha tenção que os envolvia.
- Dirigia-me para a Grande Árvore, a fim de escutar os sábios ensinamentos do velho Mocho. – esclareceu o Dragão. – Enquanto sobrevoava o vale, ao longo da fronteira da Floresta Proibida, vi-te e apercebi-me do perigo que corrias.
- Obrigado. – agradeceu a lebre evitando os olhos do Dragão. – Não sei como te poderei compensar por me teres salvo.
- Gostarias de me acompanhar até à Grande Árvore? – propôs. A Lebre corou novamente e acenou afirmativamente:
- Sim.
- Sobe então para o meu dorso. A Grande Árvore encontra-se no centro da Floresta Proibida. Seria perigoso atravessares a floresta. Assim sobrevoamo-la juntos.
- Tens a certeza?
- Sim. E descansa, é seguro. Não farei movimentos bruscos. – prometeu o Dragão, baixando-se para que a Lebre pudesse subir para o seu dorso. Timidamente, a Lebre subiu, sentindo o calor confortável que este emitia. O Dragão bateu as suas grandes asas, elevando-se para o céu. Com o impacto, a Lebre soltou um pequeno gemido e fechou os olhos com força:
- Não tenhas medo. Abre os olhos e olha à tua volta. – sugeriu o Dragão para a tranquilizar. Ao abrir os olhos ficou admirada com o que observava. Todo o vale, a floresta e o rio iluminados pelo Sol, como que pousassem para uma tela pintada com tons vivos de aguarelas simples e variadas. As flores silvestres envolviam o verde, tocadas por uma suave brisa que as fazia balançar suavemente. O olhar da Lebre perdia-se em tanta diversidade e no esvoaçar ingénuo das borboletas. Ao longe, o rio, parecia coberto de pequenos cristais reluzentes. Sugerindo um pequeno desvio, o Dragão dirigiu-se para o rio, num voou suave e rente ás suas águas límpidas.
Alguém os observava na margem do rio, escondido na sombra de um salgueiro-chorão. Olhava atento para o Dragão e a Lebre e para os seus reflexos nas águas do rio. Não viam eles a verdade reflectida pelos seus olhos verde-esmeralda. Apenas sorriam, cúmplices do seu próprio destino.

1 comentário:

Óhraesisstrákur disse...

Como é bom, depois da tempestade, sentir o calor de um abraço que desejamos que dure para sempre, e contemplar tudo quanto antes parecera obscuro e tenebroso de um novo ângulo, ancorados na sua segurança.